Carnaval tá aí. Agora é Momo que manda. Dane-se o resto.
Pois bem, o pessoal da revista
DIÁLOGO URBANO (loucos) pediram pra que eu (um bacharel em Direito, metido a jornalista) fizesse uns escritos sobre carnaval. Entrei nessa loucura e me meti a escrever a coluna.
Divido abaixo com vocês.
O pulo do gato do Carnaval
É muito comum ouvirmos que Carnaval é uma época de desconstrução de desigualdades; que o rico samba junto com o pobre, ou que, nessa época, as comunidades dos subúrbios, através das escolas de samba, são os holofotes da cidade. Agora, de onde vem essa concepção? Como as escolas de samba conseguiram atingir o patamar de reconhecimento que possuem hoje? Aí eu acho que vale a pena a gente dar uma recapitulada na história.
Até a virada do século XIX para o XX, o Entrudo era o grande divertimento do carnaval carioca. Mas que raio de diversão com nome estranho era essa? Seguinte, o Entrudo era uma festa popular de tradição portuguesa, que precedia a quaresma, onde o grande barato era sair às ruas para molhar as pessoas com baldes de água e os limões de cheiro. Esses eram fabricados em casa, com cera fina; tinham formato de laranja e eram preenchidos com água suja e xixi. Todo mundo entrava na brincadeira. Dizem que até a família Real era adepta dessa diversão.
O Entrudo fora proibido várias vezes, era também perseguido pela polícia e foi perdendo espaço. Ainda na virada de século (XIX para o XX) os jornais retomam a idéia de promover concursos carnavalescos. A imprensa acreditava que cumpria um papel pedagógico perante a população, no sentido de “ensinar” como deveria ser feito o carnaval.
Indo nesse caminho, a mídia da época adotava como padrão de carnaval, o que era realizado pelas sociedades carnavalescas e pelos ranchos. Eram esses grupos, até então, a referência de carnaval para os “ditos” formadores de opinião. Acontece que, tanto o rancho, quanto a sociedade carnavalesca, eram manifestações de parcelas mais favorecidas da população.
Por outro lado, os membros de grupos carnavalescos populares, como os Cordões, estavam em busca de reconhecimento pela imprensa, desejavam a legitimação de suas manifestações. Essa busca pelo reconhecimento da mídia era explícita. Os Cordões, em seus desfiles pelo centro da cidade do Rio, costumavam trazer faixas saudando os jornais.
Nessa busca por prestígio junto à mídia, os grupos populares passaram a encampar símbolos dos outros grupos em suas apresentações. Juntaram as alegorias oriundas das sociedades, com a baliza e mestre-sala dos ranchos, além do desfile uniforme em linha reta. Esses padrões foram incorporados ao batuques, que já comia solto nas comunidades, e a marcação do ritmo. Surge a Escola de Samba!! Fruto da criatividade e originalidade do povo do Rio (não entendam como bairrismo, por favor).
Em 1932, o jornal Mundo Esportivo promove o primeiro concurso de Escolas de Samba. Novidade na época, pois, até então, só havia disputa entre ranchos e sociedades. Aí não parou mais. Bem sucedidas em seus desfiles, as escolas de samba atraíam para si a atenção do público e da mídia. É o fenômeno que assistimos hoje.
Comecei o texto falando sobre quebra de desigualdades proporcionada pelo carnaval. Acredito, firmemente, que o samba, o carnaval e suas escolas têm o poder de remover barreiras não apenas em fevereiro, mas durante todo o ano. Posso afirmar a vocês que eu conhecia muito pouco do subúrbio. Mas o samba instiga! O interesse por suas escolas nos faz pegar o trem e beber água da fonte. Que tal conhecer Osvaldo Cruz e Madureira? Acompanhar a carreata do Império Serrano no Dia de São Jorge. Conhecer a quadra do Bloco Boêmios de Irajá – Zeca Pagodinho tem esse apelido porque sua família fazia parte da Ala do Pagodinho, nesse bloco.
Tem a roda do Cacique, domingo, finalzinho de tarde, lá na Rua Uranos. Ou o samba comandado pelo Ratinho, no quintal da sua casa, lá em Todos os Santos. Enfim, o que quero dizer é que dificilmente teria a oportunidade de conhecer esses lugares se não fosse a admiração pelo carnaval e pelo samba. Esse interesse é capaz de promover a interação social, o contato com realidades diferentes, que, a meu ver, são extremamente necessários pra quem quer o bem do Rio de Janeiro. A sensação de pertencimento ultrapassa os limites do que já era conhecido, rompe a cidade partida.
Cantar Doce Refúgio, do Fundo de Quintal, sabendo como é o Cacique de Ramos dá outra sensação. É possível até se emocionar! Aconselho aos amantes do samba a pisarem no chão e conhecer os quintais e quadras de onde saíram as melodias que tanto nos encantam. Quem gosta de carnaval não pode coroar e defender o subúrbio e suas comunidades só em fevereiro. Passemos a prestar mais atenção e a reivindicar pela cidade como um todo: zonas norte, oeste, centro e zona sul.
Acredito que é esse o pulo do gato que o carnaval pode propiciar.
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Abraços!!!